Saiba como funciona fundo que protege seu dinheiro se o banco quebrar

Saiba como funciona fundo que protege seu dinheiro se o banco quebrar

Criado há quase 30 anos, em 1995, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) cumpre essa função. Ainda desconhecido por dois terços dos brasileiros, o fundo é uma instituição privada, sem fins lucrativos, que atua como uma espécie de seguro, protegendo alguns tipos de investimentos e depósitos feitos em instituições financeiras. Além dos clientes, o FGC também auxilia os próprios bancos.

O fundo é formado a partir de recursos depositados periodicamente pelas instituições financeiras associadas – entre as quais a Caixa Econômica Federal e bancos comerciais, de investimento e de desenvolvimento. Os bancos realizam depósitos que criam uma margem financeira de segurança da qual sairá o dinheiro para pagar clientes e investidores, caso a instituição financeira vá à falência.

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O depósito no FGC é de 1 ponto-base (0,01%) mensal sobre o saldo de todos os depósitos elegíveis. O valor máximo coberto pelo fundo é de R$ 250 mil por CPF ou CNPJ e por instituição financeira. Atualmente, o FGC tem 220 instituições financeiras associadas. Segundo dados do fundo, 99,6% dos clientes dessas instituições estão 100% cobertos pela garantia de R$ 250 mil.

O FGC não cobre todas as modalidades de investimentos. Entre os itens protegidos, estão depósitos à vista, depósitos de poupança, Certificado de Depósitos Bancários (CDB), Recibo de Depósitos Bancários (RDB), Letras de Crédito Imobiliário (LCI), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA, Letras de Câmbio (LC) e Letras Hipotecárias (LH).

Em entrevista ao Metrópoles, o diretor-executivo do FGC, Daniel Lima, afirmou que, entre os principais objetivos do fundo, estão assegurar a “estabilidade do sistema financeiro” e “proteger o pequeno depositante”. “O nosso papel, basicamente, é acalmar o mercado quando há algum evento de quebra bancária”, diz Lima, nomeado em 2019 para ocupar o cargo.

Ele também deu exemplos práticos sobre o funcionamento do FGC e traçou perspectivas para 2023, apontando inflação e inadimplência como os dois problemas que merecem mais atenção.

Daniel Lima, diretor-executivo do Fundo Garantidor de Créditos

Leia os principais trechos da entrevista de Daniel Lima ao Metrópoles:

Qual é o principal objetivo do Fundo Garantidor de Créditos?

O objetivo do FGC é a estabilidade do sistema financeiro. O nosso papel, basicamente, é acalmar o mercado quando há algum evento de quebra bancária. Suponhamos que há um banco que não vai muito bem das pernas e acaba sofrendo uma liquidação. Os clientes desse banco podem ficar assustados e achar que todo o sistema está em risco. É um gatilho para uma corrida bancária. Um evento como esse em um banco mais frágil pode acionar uma crise que se espalha para todos os bancos. Se você conta com um mecanismo de proteção como o FGC, não precisa sair correndo caso o seu banco quebre. Pode confiar que o FGC terá dinheiro para lhe pagar.

Como é essa operação para proteger o patrimônio do investidor caso a instituição financeira sofra intervenção ou liquidação?

Quando o Banco Central decreta a liquidação de um banco, também nomeia um liquidante para essa instituição. O liquidante chega e começa a compilar uma base de dados, que é a lista de credores. Uma vez consolidada a lista, ele manda esse arquivo para o FGC, e é aí que começa o nosso trabalho – que é, efetivamente, pagar esses credores. No passado, o liquidante levava três ou quatro semanas para compilar essas informações. O FGC, então, precisava designar onde as pessoas receberiam fisicamente o seu benefício. Isso levava outras três semanas. O processo de pagamento começava mais de um mês depois da falência do banco. Em outubro de 2020, lançamos um aplicativo para celular. Hoje, a pessoa entra por ali, tira uma selfie, preenche os dados, fornece os documentos, faz assinatura eletrônica, e agora conseguimos fazer o pagamento dois dias depois de recebermos a lista de credores. Aquele prazo total de aproximadamente 45 dias hoje caiu para cerca de 20. E podemos avançar mais.

O valor máximo coberto pelo FGC é de R$ 250 mil por CPF ou CNPJ em cada instituição financeira. O senhor poderia dar alguns exemplos práticos sobre o funcionamento dessa garantia?

Suponhamos que uma pessoa tinha uma conta de poupança com R$ 100 mil, um CDB do mesmo banco de mais R$ 100 mil e ainda comprou um CDB desse banco por uma corretora, de mais R$ 100 mil. No nosso exemplo, deu R$ 300 mil, mais os juros de R$ 10 mil. Um total de R$ 310 mil. A pessoa não terá direito a receber do FGC esses R$ 310 mil porque o limite é de R$ 250 mil. Nós vamos pagar os R$ 250 mil, e a pessoa terá um excesso de R$ 60 mil e continuará como credora do banco que está sendo liquidado. Vai depender do tempo que vai levar para a falência acontecer, mas há uma chance de reaver essa outra parte. De qualquer forma, o fato é que imediatamente a pessoa recebe os R$ 250 mil. E não são só R$ 250 mil por CPF. É por CPF e por banco. O mecanismo é generoso e serve para proteger o pequeno depositante. Os limites são adequados à realidade brasileira.

O FGC se apresenta como um instrumento que atua de forma preventiva junto aos sistemas bancário e financeiro, e não apenas em momentos de emergência. Como é exercido esse papel?

O FGC ganhou esse novo papel depois de 2008, quando houve aquela crise bancária mundial que começou nos Estados Unidos e se alastrou. O que ficou muito claro naquele momento é que vale a pena, em certos casos, você ajudar o banco e não deixá-lo quebrar. Vamos supor que um banco tem depósitos garantidos de R$ 4 bilhões. Se ele quebrar, o FGC terá de pagar R$ 4 bilhões. Mas se emprestarmos R$ 1 bilhão, dependendo do caso, o banco pode ser salvo e nós não precisaremos gastar R$ 4 bilhões. Na maioria das vezes, se a operação der certo, não temos de gastar nem R$ 1 bilhão, porque o valor é um empréstimo e será ressarcido ao longo do tempo. Isso aconteceu algumas vezes entre 2010 e 2020, quando alguns bancos tiveram problemas de liquidez. O FGC emprestou recursos. É muito menos traumático muito mais barato para a sociedade.

Intervenções ou liquidações de bancos eram mais comuns nos anos 1990. O trabalho do FGC ficou mais fácil hoje, em um cenário mais estabilizado do sistema bancário brasileiro?

É realmente um cenário diferente em termos macroeconômicos e também porque todo mundo aprendeu com o que aconteceu no fim da década de 1990. A supervisão do Banco Central amadureceu muito, está mais presente e usa mais dados. A regulamentação melhorou. O ambiente da indústria melhorou porque ela se desenvolveu aprendendo com as próprias crises que enfrentou. Não vemos mais tantos casos de instabilidade financeira como tínhamos no passado. Mas a verdade é que estamos sempre nos preparando para o próximo grande problema. O nosso job description é nos preocuparmos e nos prepararmos para cenários de baixa probabilidade. Afinal, não é porque não está acontecendo ou não aconteceu nos anos recentes que não pode acontecer em algum momento.

Qual tem sido o impacto do avanço tecnológico no sistema bancário brasileiro?

Estamos vivendo uma mudança estrutural no sistema, com serviços bancários prestados por “não bancos”. O banco A não sofre mais só a competição do banco B, mas também de agentes fora do mercado bancário. Hoje é tudo digital. O canal com o cliente deixou de ser a agência e passou a ser o celular. É claro que você fica mais exposto a riscos de insegurança cibernética. Há novos riscos, mas também benefícios. O custo da operação é menor, a tecnologia ajuda muito a você expandir e ganhar escala, atingindo novos consumidores. É uma dinâmica muito diferente que nós, do fundo, estamos observando de perto.

Apesar de ter sido criado em 1995, o FGC é conhecido por apenas um terço dos brasileiros. A que o senhor atribui esse desconhecimento e como tornar o fundo mais conhecido pela população?

A minha impressão pessoal é a de que esse dado é relativamente natural. O Brasil não é um país de poupadores. Se você depurar a parcela da população que tem investimentos ou excesso de recursos financeiros para depositar no CDB ou na poupança, é um número muito reduzido. Quem vai conhecer mais o FGC é a população poupadora. Nesse sentido, o fato de um terço dos brasileiros conhecerem o FGC significa que temos uma penetração não tão pequena assim. Independentemente disso, temos de estar mais presentes, informar mais pessoas sobre o FGC.

Quais as perspectivas do FGC para 2023?

Vamos entrar bem capitalizados no ano que vem. Os nossos modelos de cenário de estresse mostram que estamos prontos para enfrentar situações muito complexas. Não antevemos uma crise severa. Mas há pontos de grande atenção, como inadimplência, inflação alta, taxa de juros, comprometimento de uma parcela substantiva da renda dos trabalhadores, não se sabe para que lado vai o emprego… Tudo isso afeta o mercado de crédito. Estamos muito atentos para mapear de onde vêm esses problemas.

O que mais preocupa para o ano que vem, a inflação ou a inadimplência?

Elas se retroalimentam. A taxa de juros responde a uma inflação alta. Quanto maior a inflação, maior a taxa de juros. Isso corrige o saldo das dívidas por uma taxa de juros maior. No frigir dos ovos, são problemas da mesma natureza. Você tem um aumento expressivo dos juros, o que aumenta o comprometimento da renda, e a pessoa privilegia os gastos fundamentais com alimentação, vestuário, saúde, principalmente nesses momentos em que o dinheiro está mais curto. Assim, a parcela do banco acaba atrasando e gera essa inadimplência. Se eu tiver de escolher apenas um, acredito que a inadimplência é o nosso principal ponto de atenção.

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