STF forma maioria contra legítima defesa da honra em feminicídio

STF forma maioria contra legítima defesa da honra em feminicídio

O ministro Dias Toffoli, relator do caso, abriu os votos e considerou a tese inconstitucional. Ele observou que o argumento não pode ser encarado como uma leitura da “legítima defesa”, prevista na legislação, ou usado para justificar crimes de feminicídio.

“Concluo que o recurso à tese da “legítima defesa da honra” é prática que não se sustenta à luz da Constituição de 1988, por ofensiva à dignidade da pessoa humana, à vedação de discriminação e aos direitos à igualdade e à vida, não devendo ser veiculada no curso do processo penal nas fases pré-processual e processual, sob pena de nulidade do respectivo ato postulatório e do julgamento, inclusive quando praticado no tribunal do júri”, decidiu.

Até o momento, o relator foi seguido pelos colegas Rosa Weber, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Edson Fachin e Alexandre de Moraes. Assim como Toffoli, os três últimos também incluíram voto escrito no plenário virtual.

Em sua manifestação, Gilmar Mendes classificou a interpretação como “abusiva” e “pautada por ranços machistas e patriarcais que fomentam um ciclo de violência de gênero na sociedade”. “Sem dúvidas, vivemos em uma sociedade marcada por relações patriarcalistas, que tenta justificar com os argumentos mais absurdos e inadmissíveis as agressões e as mortes de mulheres, cis ou trans, em casos de violência doméstica e de gênero”, criticou Gilmar Mendes no voto.

“A tese de “legítima defesa da honra” aflora nas discussões e em alguns casos de julgamentos por jurados para justificar (manifestamente de modo absurdo e inadmissível) atos aberrantes de homens que se sentem traídos e se julgam legitimados a defender a sua honra ao agredir, matar e abusar de outras pessoas”, acrescentou.

Na mesma linha, o ministro Edson Fachin classificou a tese como “odiosa”. Ele proferiu o terceiro voto para tornar o argumento inconstitucional. Em sua manifestação, observou que o ordenamento jurídico não veda a investigação sobre a “racionalidade mínima” que deve guardar toda e qualquer decisão, incluindo as dos tribunais do júri.

“Se é certo que o Tribunal do Júri guarda distinções em relação à atividade judicial típica, não deixa de ser também um julgamento, isto é, a aplicação de uma norma jurídica a um caso particular e, como tal, deve guardar um mínimo de racionalidade e de objetividade”, apontou Fachin. “A importante tarefa de julgar não pode ser um jogo de dados”.

O ministro Alexandre de Moraes disse que a tese “remonta ao Brasil colonial” e funciona como “salvo-conduto” para a prática de crimes violentos contra mulheres. “Não obstante tais avanços legais e institucionais, verifica-se, ainda, a subsistência de um discurso e uma prática que tentam reduzir a mulher na sociedade e naturalizar preconceitos de gênero existentes até os dias atuais, perpetuando uma crença estruturalmente machista, de herança histórica, que considera a mulher como inferior em direitos e mera propriedade do homem”, escreveu.