Saiba quais casos investigados pela PF no RJ que já foram citados por Bolsonaro

Superintendência Regional apura uso de laranjas pelo PSL do RJ, o assassinato de Marielle, a evolução patrimonial de Flávio Bolsonaro e a tentativa de troca de comando [...]

Saiba quais casos investigados pela PF no RJ que já foram citados por Bolsonaro
Superintendência Regional apura uso de laranjas pelo PSL do RJ, o assassinato de Marielle, a evolução patrimonial de Flávio Bolsonaro e a tentativa de troca de comando no Porto de Itaguaí. Direção-geral confirmou Tácio Muzzi no comando da PF fluminense. O diretor-geral da Polícia Federal (PF), Rolando de Souza, escolheu nesta quarta-feira (6) Tácio Muzzi para o comando da Superintendência Regional do Rio de Janeiro. O então superintendente, Carlos Henrique Oliveira, assumiu a Direção Executiva da PF.

A troca ocorre um dia depois de vir à tona o depoimento de Sergio Moro à própria PF, prestado no último sábado (2).

Tácio Muzzi, novo superintendente regional da Polícia Federal (PF) no Rio

Reprodução/TV Globo

O ex-juiz e agora ex-ministro da Justiça e da Segurança afirmou que o presidente da República, Jair Bolsonaro, estaria tentando interferir politicamente na instituição – e a seção fluminense era interesse direto do presidente, segundo Moro.

"A mensagem tinha, mais ou menos, o seguinte teor: 'Moro, você tem 27 Superintendências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro'", diz relatório sobre o depoimento do ex-ministro.

"O RJ é meu estado", retrucou Bolsonaro.

Pelo menos quatro inquéritos abertos pela PF no RJ desde 2019 foram alvo de comentários de Bolsonaro nos últimos meses:

Supostos laranjas do PSL fluminense

O porteiro do Caso Marielle

Patrimônio de Flávio Bolsonaro

A Receita e o Porto de Itaguaí

Veja, a seguir, detalhes de cada um – e o que disse Bolsonaro sobre eles.

1. Laranjas do PSL fluminense

Sobre o que trata: irregularidades na campanha do Partido Social Liberal (PSL), sigla que levou o presidente ao poder. A Superintendência Regional investigava o caixa do PSL fluminense.

O que disse Bolsonaro: "Pelo que eu sei até o momento há um exagero no inquérito. Vamos aguardar o desenrolar do processo. Em primeiro lugar sou eu, Bolsonaro, querem me rotular como corrupto ou como dono de laranjal" ('10 de outubro de 2019, em live, aos 18 minutos)

JN: Prestação de contas de candidatos do PSL teve ação de laranjas

Detalhes do processo

Em junho de 2019, o Jornal Nacional mostrou pessoas usadas como laranjas para simular doações de dinheiro e de prestação de serviços, movimentando dinheiro de origem desconhecida no caixa do partido no Rio de Janeiro, então presidido pelo filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro.

A investigação foi aberta na PF quase um mês depois de a Justiça Eleitoral ter determinado a apuração, no dia 24 de setembro de 2019.

O promotor que pediu a abertura do inquérito disse ter constatado "a existência de indício de eventual prática do crime previsto no artigo 350 do Código Eleitoral", que trata de falsidade ideológica e Caixa 2.

O senador Flávio Bolsonaro

Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo

Em outros segmentos da investigação, a PF chegou a prender Mateus Von Rondon, assessor especial do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio.

Os dois principais nomes do governo de Bolsonaro que foram atrelados ao esquema são o do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e o do ex-ministro da Secretaria-geral da Presidência, Gustavo Bebianno -- que morreu de infarto em março.

O presidente do PSL, o deputado federal Luciano Bivar, também é alvo de investigações.

Em novembro, Bolsonaro anunciou a saída do PSL e a fundação de um partido -- o Aliança pelo Brasil. A nova sigla ainda não foi oficializada.

Os "laranjas" flagrados pelo JN deveriam ter sido chamados para prestar depoimento. Como o caso corre em sigilo, até agora não se sabe qual foi o avanço do trabalho policial no Rio de Janeiro.

2. O porteiro do Caso Marielle

Sobre o que trata: A denúncia de um vigia sobre a movimentação, no dia do atentado, no condomínio onde a família Bolsonaro tem casas.

O que disse Bolsonaro: "Eu fui acusado de tentar matar a Marielle. Você quer algo mais grave que isso? Não interessa quem seja. Acusado de um assassinato. Um presidente da República acusado de um assassinato. A Polícia Federal tinha que investigar. Por que não investigou com profundidade?" (5 de maio)

Caso Marielle: suspeito entrou em condomínio alegando ir à casa de Bolsonaro, diz porteiro

Detalhes do processo

O atentado está sendo investigado pela Polícia Civil do RJ, que afirma ter encontrado os assassinos – os ex-PMs Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz. Os dois estão presos na Penitenciária Federal de Porto Velho (RO).

A PF, porém, entrou no caso depois que o Jornal Nacional trouxe o depoimento de um porteiro do Vivendas da Barra, condomínio onde Jair e Carlos têm casas e onde morava Ronnie Lessa.

Esse porteiro afirmou – e depois desmentiu – que no dia do homicídio anotou o número da casa do presidente como suposto destino de Élcio.

O vigia chegou a confirmar essa versão em, pelo menos, dois depoimentos, gravados em vídeo, à Polícia Civil do Rio.

Condomínio Vivendas da Barra, no Rio, onde suspeitos da morte de Marielle Franco se encontraram

Tânia Rêgo/Agência Brasil

Naqueles depoimentos iniciais, o porteiro disse ainda que ligou para a casa 58 duas vezes e que a autorização para a entrada de Élcio no condomínio veio de alguém cuja voz, segundo ele, era a do "Seu Jair".

O Jornal Nacional também mostrou desde a primeira reportagem que, naquele dia, Jair Bolsonaro estava em Brasília e registrou presença em votações no plenário da Câmara.

A Polícia Civil do RJ afirma que Ronnie e Élcio saíram da Barra no fim da tarde para matar Marielle.

Após movimentação de Moro e da Procuradoria Geral da República, a PF do Rio abriu um inquérito em que usou como um dos argumentos o artigo 26, da lei 7.170, que trata de calúnia ou difamação do presidente da República.

Semanas depois, vazou para a imprensa a informação de que o porteiro teria mudado de versão – alegando ter se enganado, tanto na anotação, como nos dois depoimentos anteriores.

O inquérito está em andamento na PF e sob sigilo decretado pela Justiça Federal.

3. Patrimônio de Flávio Bolsonaro

Sobre o que trata: o suposto enriquecimento ilícito do hoje senador, em especial no ramo imobiliário. A evolução patrimonial de Flávio e as supostas "rachadinhas" também são investigadas pelo MPRJ.

O que disse Bolsonaro: "Quem está feliz por essa exposição absurda na mídia? Alguém está feliz. Agora, se eu não tiver a cabeça no lugar, eu alopro" (21 de dezembro). O presidente se referira especificamente às ações do MP fluminense – e não da PF. "O processo está em segredo de Justiça? Te respondo: está, né? Quem é que julga: é o MP ou o juiz? Os caras vazam e julgam? Paciência, pô. Qual é a intenção? Estardalhaço enorme. Será porque falta materialidade para ele e equivale ao desgaste agora? Quem está feliz por essa exposição absurda na mídia?"

MP-RJ diz que Flávio Bolsonaro lavava dinheiro de loja de chocolate

Detalhes do processo

Tanto o MPRJ quanto a PF investigam a evolução patrimonial do senador, a partir de indícios da época em que era deputado estadual.

Na PF, o caso foi aberto após um advogado reunir reportagens que apontavam uma carreira de sucesso de Flávio como empreendedor imobiliário.

No dia 22 de março de 2015, Flávio inaugurou uma loja da franquia Kopenhagen, no Shopping Via Parque, na Barra da Tijuca.

Reprodução

No Ministério Público, o foco é a suspeita da prática da rachadinha – quando assessores são contratados sob a premissa de devolver parte do salário.

O MP tomou como base para os trabalhos relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), como informes de depósitos e saques.

Foi esse relatório que revelou as operações suspeitas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), envolvendo até a primeira-dama do país, Michelle Bolsonaro.

Os promotores responsáveis pelo caso já conseguiram quebrar o sigilo dos investigados e mapear um suposto esquema de lavagem de dinheiro do então deputado estadual, que arrecadaria, por fora, dinheiro vindo do salário dos servidores do gabinete e aplicaria em uma loja de chocolate como, também, em operações imobiliárias suspeitas.

Coaf cita pagamento de título bancário de R$ 1 milhão em relatório sobre Flávio Bolsonaro

Reprodução/JN

A defesa de Flávio tinha entrado, até a publicação desta reportagem, com nove recursos desde o início do processo para tentar paralisar as investigações. Todos foram negados.

O G1 apurou que o delegado da PF responsável pela apuração encerrou o inquérito em fevereiro e encaminhou para a Justiça Eleitoral. Até agora, não se sabe qual foi o teor dessa conclusão da PF.

4. A Receita e o Porto de Itaguaí

Sobre o que trata: denúncias de corrupção na Aduana do Porto de Itaguaí, cuja diretoria esteve na mira do presidente

O que disse Bolsonaro: "A Receita Federal tem problemas. Faz um bom trabalho? Faz, mas tem problemas e devemos resolver esses problemas. Como? Trocando gente. O estado todo está aparelhado, todo, sem exceção" (21 de agosto de 2019)

Auditores protestam contra o que consideram tentativa de interferência política na Receita

Detalhes do processo

Uma equipe de auditores é investigada pela PF por supostamente ter recebido propinas para afrouxar a fiscalização no Porto de Itaguaí.

Há suspeitas de que o entreposto, cercado por comunidades dominadas por milícias, seja usado para importação de armas de guerra para milicianos – as operações ilegais seriam feitas até em alto-mar.

O quadro mudou quando o auditor José Alex de Oliveira assumiu a Aduana de Itaguaí, em 2018. Sob sua gestão, a Receita chegou a R$ 1 bilhão em mercadorias ilegais apreendidas.

Porto de Itaguaí tem R$ 1 bilhão em mercadorias irregulares apreendidas pela Receita Federal desde 2018

Reprodução/TV Globo

Em 2019, porém, o presidente Jair Bolsonaro defendeu uma substituição nos quadros da Receita Federal – uma das trocas seria em Itaguaí.

Em agosto, auditores fiscais fizeram manifestações em várias cidades contra o que consideram uma tentativa de interferência política no órgão.

O presidente recuou e deixou José Alex Oliveita no cargo – ele ocupa a função até hoje.

Um inquérito sigiloso foi aberto na Polícia Federal para apurar a conduta dessas pessoas. Até agora, não se conhecem resultados.